Especial Oscar: Um Homem Sério (Dir: Ethan e Joel Coen)

26/02/2010

Créditos: Sem Tédio

Os irmãos Coen nunca foram diretores que possamos chamar de convencionais. Revitalizaram o gênero policial com Fargo – Uma Comédia de Erros, filmaram uma comédia pra lá de maluca (Queime Depois de Ler) e conseguiram o Oscar de Melhor Filme e Diretor com o extremamente sombrio com Onde os Fracos Não Tem Vez. Os Coen podiam se gabar de ter uma filmografia eclética e impecável – até agora. Este Um Homem Sério só pode ser entendido como uma obra bastante pessoal, mas que não deve agradar em nada o público: a obra possui tantos problemas, que mesmo sendo uma comédia, é impossível dar uma boa risada sequer – no máximo, um sorriso amarelo vez ou outra.

Depois que assisti ao filme, fiquei pasmo pelo filme ter sido indicado para o prêmio máximo da Academia. O filme não é nem de longe um dos 10 melhores do ano! A única explicação que encontrei por parte da crítica (isto é, da parte que não gostou do filme) veio de Rubens Ewald Filho. Ele acredita que, pelo filme ser totalmente voltado para a cultura judia, caiu nas graças de Hollywood, que é o local de trabalho para muitos praticantes de tal religião. Será? Por incrível que pareça, eu acho que é uma boa explicação, porque Um Homem Sério, por seus próprios méritos, conseguiria apenas uma indicação ao Framboesa de Ouro, o Oscar dos piores.

O filme peca, principalmente, pela sua falta de ritmo. Ele gira em torno de Larry Gopnik (Michael Stuhlbarg), um professor que leva uma vida insuportável: sua mulher se separou dele e o expulsou de casa para colocar o amante no lugar; seus filhos só ligam para dinheiro e outras coisas materiais, sem ligar para o pai; está sendo ao mesmo tempo subornado e chantageado por um aluno que foi mal em uma prova da faculdade na qual leciona; ainda por cima, tem que tomar conta de seu irmão que não tem onde morar.

Dos 100 minutos de projeção, os primeiros 70 são reservados para as agruras e sofrimentos de Gopnik. Nesta parte, a trama não avança nem um pouco. Vemos o coitado sofrer sem fazer nada por todo esse tempo, e, mesmo que fiquemos com pena dele, ficar mais de uma hora nessa lengalenga é imperdoável, uma vez que o público cansa sem ver algum grande conflito. Afinal, Um Homem Sério parece mesmo um simples relato da vida de uma homem, não uma história propriamente dita. Apenas na meia hora final o protagonista se rebela e tenta tomar as rédeas de sua própria vida, mas é tarde. O interesse já foi todo perdido.

E por ser uma comédia, é esperado que as pessoas rissem, não é? Não espere gargalhar nesse filme. O estranho é que a última comédia da dupla de diretores, Queime Depois de Ler, mesmo sendo um tanto alternativa, era hilária e foi uma grande surpresa. Esta, no entanto, sustenta-se em piadas repetitivas e outras muito específicas, talvez só compreensíveis para praticantes da religião judaica. Ou seja, Um Homem Sério é um filme arrastado, já que não tem boas piadas ou mesmo uma narrativa envolvente.

Mas, ainda bem, o elenco consegue chamar alguma atenção para o que acontece na tela. O motivo que gostamos tanto de Larry é sem dúvida por causa de Michael Stuhlbarg. Ele passa tanta sinceridade e credibilidade com seu personagem que é impossível não nos preocuparmos com seu destino. Se não fosse por ele, talvez Um Homem Sério se tornasse uma experiência bastante desagradável. Os coadjuvantes também contribuem para tornar Um Homem Sério um pouco mais interessante: Richard Kind, como o irmão de Larry, constrói um personagem melancólico diferente das comédias que ele costuma fazer. Já Fred Melamed (aquele ator que você já viu em várias produções, mas não sabe seu nome) rouba a cena toda a vez como Sy Ableman, o amante da mulher de Larry. Pena que a participação dele seja tão pequena.

A tese dos Coen de que a vida é imprevisível e surpreendente com certeza foi confirmada, mas não nos esqueçamos que isso é um filme, não uma pesquisa científica. Aquele precisa de certos elementos para funcionar, uma boa trama sendo o principal deles. E isso Um Homem Sério não tem.

Se comecei citando um crítico que não gostou do filme, termino com outro que gostou: Roger Ebert. Ele opina que Um Homem Sério seja a recompensa dos Coen pelo reconhecimento de Onde os Fracos Não Têm Vez. Talvez eles tenham criado um filme para que eles possam se divertir – e apenas eles.

FICHA TÉCNICA

Título original:  A Serious Man
Ano de lançamento: 2009
Direção: Joel e Ethan Coen
Produção: Joel e Ethan Coen
Roteiro: Joel e Ethan Coen
Elenco: Michael Stuhlbarg (Larry), Richard Kind (Arthur),  Fred Melamed (Sy), Sari Lennick (Judith).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Roteiro Original.
 
Nota: 4.0
 
Próximo post do Especial Oscar: Apostas para o Oscar.

Especial Oscar: Educação (Dir: Lone Scherfig)

23/02/2010

Créditos: Movie City News

Quando li a sinopse desse filme, pensei: mais uma história de transição da juventude para a idade adulta? Depois de bons filmes sobre o tema como Quase Famosos, O Senhor das Moscas, Conta Comigo, Cinema Paradiso e Ensina-me a Viver, Educação teria trabalho para apresentar algo novo. Realmente, a película não é nada revolucionária, mas aborda com vigor algumas questões relevantes. Além disso, o roteiro é ágil e bem-humorado, e a atuação de Carey Mulligan está entre uma das melhores do ano. Por isso, a indicação a Melhor Filme é justificável, embora outros filmes igualmente bons tenham ficado de fora da disputa.

O cenário dos acontecimentos aqui é a conservadora Londres dos anos 60. Jenny (Mulligan) conhece um homem com o dobro de sua idade (o insosso como sempre Peter Sarsgaard), que a leva para um mundo que ela há muito queria conhecer: o do glamour. Jantares em restaurantes caros, passeios culturais, visitas a leilões… Á medida em que fica mais e mais apaixonada por ele, Jenny pensa em largar os estudos. O grande conflito do filme é: o que é mais importante – entregar-se de cabeça a um amor verdadeiro ou estudar e garantir um futuro próprio?

É um filme discreto, mas mesmo assim eficaz, contando uma boa história e provocando algumas reflexões. A narrativa, que se sustenta principalmente em diálogos entre os protagonistas, poderia facilmente cair no marasmo. Nick Hornby, que assina o roteiro, adaptou muito bem as memórias de Lynn Barber e conseguiu dar ritmo a todas as cenas, com diálogos rápidos, inteligentes e adoráveis. Além disso, na parte final da película, os conflitos abordados, se não são originais, pelo menos são bem trabalhados. Hornby consegue transmitir idéias que permanecem na mente do espectador mesmo depois do filme ter terminado. Mas o maior trunfo do roteiro são os personagens. Não há dúvida de que Jenny é o personagem mais bem escrito, já que ela possui as melhores falas, o que nos faz sempre prestar atenção nela e esperar seu próximo comentário irônico ou contundente. Além disso, não só Jenny como os outros personagens surpreendem também: suas nuances e evoluções ao longo da trama são totalmente naturais (algo que é cada vez mais raro hoje em dia), tornando-a crível. A indicação a Melhor Roteiro foi mais do que merecida.

A dinamarquesa Lone Scherfig surpreende na direção, neste que é seu primeiro filme falado em inglês. Ela é uma excelente diretora de atores, um dos pontos altos do filme (veja mais abaixo). Também devo citar que as cenas do filme são belíssimas: a fotografia é cuidadosa, nunca sendo espalhafatosa. Espero mesmo que ela faça mais filmes em inglês, para podermos conferir mais do seu trabalho.

Como já falei antes, as atuações de Educação são o que mais faz a produção valer a pena. Carey Mulligan, com apenas 24 anos de idade, dá um show, criando uma Jenny sincera e carismática. Ela ilumina a tela, tamanho o seu talento e carisma. Pode surpreender e ganhar o Oscar – a categoria de Melhor Atriz é uma das poucas que não parece definida. Os coadjuvantes também arrasam: o sempre excelente Alfred Molina transforma um clichê (pai conservador e autoritário) em uma figura simpática. Já Rosamund Pike mostra que é uma ótima comediante ao servir de alívio cômico para a história. Olivia Williams e Emma Thompson também funcionam muito bem como coadjuvantes. Pena que o filme tenha no elenco Peter Sarsgaard (A Órfã) e Dominic Cooper (A Duquesa) para estragar o clima, mas qual filme é perfeito?

Educação é um filme despretensioso e envolvente, que mesmo não sendo inovador consegue atingir o seu objetivo, que é o de discutir sobre a dificuldade de se estudar versus a facilidade de casar e ser feliz. Vale a pena assistir.  

FICHA TÉCNICA

Título original:  An Education
Ano de lançamento: 2009
Direção: Lone Scherfig
Produção: Finola Dwyer e Amanda Posey
Roteiro: Nick Hornby
Elenco: Carey Mulligan (Jenny), Peter Sarsgaard (David), Alfred Molina (Jack), Cara Seymour (Marjorie), Dominic Cooper (Danny), Rosamund Pike (Helen).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Atriz (Carey Mulligan).
 
Nota: 7.0
Próximo filme do Especial Oscar: Um Homem Sério (A Serious Man).

Especial Oscar: Um Sonho Possível (Dir: John Lee Hancock)

17/02/2010

Créditos: Cine Araújo

Um Sonho Possível é o tipo de filme que sempre figura nos indicados a Melhor Filme do Oscar. Faz parte das produções convencionais, clichês, mas que trazem enredos de superação e exemplos de vida, o que sempre cativa a platéia. Realmente, não há como negar que a história da película é envolvente. Por outro lado, também é fato que Um Sonho Possível é limitado, não se diferenciando em nada de filmes similares.

O “exemplo de vida” aqui é intensificado por existir de verdade: trata-se do jogador de futebol americano Michael Oher (interpretado com carisma por Quinton Aaron). Ainda na adolescência, ele foi abandonado pela mãe. Sem casa, com problemas de aprendizado e acima do peso, sua vida parecia estar totalmente sem rumo até seu encontro com a caridosa família Tuohy, que o acolhe. Aos poucos, a relação entre o rapaz com os membros da família (principalmente a matriarca Leigh Anne, vivida por Sandra Bullock no melhor papel de sua carreira) se intensifica e sua vida vai aos poucos melhorando. Ao aprender a jogar futebol americano, várias portas passam a se abrir para o rapaz, portas estas que antes estavam fechadas para ele.

 Como disse antes, Um Sonho Possível é mais do mesmo. Essa história já foi vista antes, o modo como essa história é contada já foi visto antes… mas mesmo assim nós continuamos a vê-las. Por que? Talvez porque gostamos de ver esse tipo de filme, que nos enchem de esperança e elevam nossa auto-estima. E o fato da história ter acontecido de verdade deixa as pessoas que assistem ao filme mais satisfeitas. Afinal, num mundo violento e cruel em que vivemos hoje, é preciso algo que nos faça continuar vivendo, algo que nos faça acreditar que a humanidade não está perdida. Se pensarmos desse modo, Um Sonho Possível atinge esse objetivo e talvez esteja aí a razão por ele ter sido indicado ao Oscar.

Mas não deveria. Havia vários outros filmes que conseguiram trazer mensagens mais bem elaboradas de modo não tão escancarado, como Invictus de Clint Eastwood e O Mensageiro, de Oren Moverman. O diretor de Um Sonho Possível, John Lee Hancock (que também assinou o roteiro, baseado na obra de Michael Lewis), não se esforça nem ao menos para montar a história de uma maneira diferente. Ela segue o mesmo modelo de sempre: pessoa com problemas encontra alguém – esse alguém ajuda a pessoa e vice-versa – os dois estão mudados para sempre. Para piorar, Hancock ainda modifica a história real para dar mais emoção à narrativa: na verdade, Oher já sabia jogar futebol americano quando foi morar com os Tuohys. No filme, ele é mostrado como um bobalhão que só consegue se dar bem no esporte com a ajuda de Leigh Anne. Oher não gostou nada quando viu o filme, e eu também não. O problema aqui nem é modificar o que aconteceu de verdade, afinal, isso é um filme de ficção, não um documentário; mas sim o fato do diretor ter contribuído para o filme se tornar mais medíocre ainda! Afinal, deve ter pensado Hancock, se o protagonista já fosse bom em alguma coisa no começo do filme, seu sucesso não seria tão apreciado no fim do filme! Se for isso mesmo, quanta bobagem, pois o simples fato dele não ter qualquer perspectiva na vida antes de encontrar os Tuohys e depois, sim, já é uma boa premissa para o filme.

Se podemos dizer que Um Sonho Possível tem algo que valha a pena, este algo é a atuação de Sandra Bullock e a de Quinton Aaron. Sandra, que pela primeira vez fica loira no cinema, mergulha de cabeça em seu papel. Sempre que ela aparece na tela dá para sentir seu comprometimento ao personagem mostrando com eficácia toda a gama de emoções que uma mãe de família sente diariamente. Sua indicação ao Oscar foi merecida, mas a atriz pode sair de mãos abanando da premiação pela forte concorrência na categoria de Melhor Atriz (atrizes de peso também estão na disputa, como Helen Mirren e Meryl Streep). Pelo menos ela já conseguiu prêmios importantes como o Screen Actors Guild Awards e o Globo de Ouro. Quinton Aaron também está muito bem. Ele constrói um Michael Oher bastante simpático, conquistando os espectadores desde a primeira cena. É uma grande revelação – espero que ele receba no futuro papéis mais desafiadores do que este, porque dá pra ver que ele dá conta.

É simples assim: se você quer ver um filme agradável, com final feliz e que te motive, veja Um Sonho Possível. Se, ao contrário, estiver procurando uma história mais elaborada e surpreendente, então fique longe.

FICHA TÉCNICA

Título original:  The Blind Side
Ano de lançamento: 2009
Direção: John Lee Hancock
Produção: Gil Netter, Andrew A. Kosove, Broderick Johnson.
Roteiro: John Lee Hancock
Elenco: Sandra Bullock (Leigh Anne), Quinton Aaron (Michael Oher), Tim McGraw (Sean), Jae Head (S. J.), Lily Collins (Collins), Kathy Bates (Miss Sue).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Atriz (Sandra Bullock).
 
Nota: 5.0
 
Próximo filme do Especial Oscar: Educação (An Education).

Especial Oscar: Bastardos Inglórios (Dir: Quentin Tarantino)

15/02/2010

Tarantino é um dos maiores diretores do cinema contemporâneo. Depois de sua estreia no cinema com a grata surpresa Cães de Aluguel, ele nos presenteou com uma obra definitiva, Pulp Fiction, um marco dos anos 90. Logo vieram os bons Jackie Brown e os dois filmes de Kill Bill. Ele então fez o apenas regular Prova de Morte. Mas, com Bastardos Inglórios, nossa…posso dizer com segurança que é a obra-prima do diretor.

Seus filmes, até este, se passavam no mundo atual. Por isso, ao ambientar Bastardos no fim da Segunda Guerra Mundial, Tarantino deixoupúblico e crítica apreensivos. Será que ele conseguiria impor seu estilo pop, violento e ao mesmo tempo cômico e seus diálogos rápidos e inteligentes a um filme de guerra? A resposta é sim, pois, além do diretor ter reunido todas as suas características clássicas neste filme, ele as elevou a um novo nível, transformando Bastardos em uma belíssima obra de arte, o que marca seu amadurecimento cinematográfico.                                                                                                                                                                                                         Lógico

Créditos: Daily Danny

Lógico que essa história de guerra não é nada convencional (desconfio até se passar numa realidade paralela, por alguns fatos narrados podem arrepiar os cabelos de professores de História mais conservadores…). Ele segue a trajetória de três grupos, que no final, se encontram, como em Pulp Fiction. Um deles é o nada mais, nada menos que os Bastardos Inglórios, soldados com a simples missão de matar nazistas, como bem explica o seu líder, Aldo Raine (Brad Pitt, que está ótimo em um papel cômico). O segundo consiste dos altos escalões nazistas (incluindo um Hitler abobalhado). Aqui, o personagem aparentemente onipresente e o mais interessante do longa é do coronel Hans Landa (uma atuação mais do que brilhante de Christoph Waltz, que ganhará o Oscar), um “caçador de judeus” poliglota e assustador pelo seu tom de voz calmo. Já o último é  composto unicamente por Shoshanna (uma discreta mas eficaz Mélanie Laurent), que teve sua família assassinada por Landa e quer vingança. Tudo vai culminar numa sessão de cinema em que o próprio Führer comparece.

Já na primeira cena nos deparamos com o talento de Tarantino. É uma introdução longa, de vinte minutos, mas que passa voando graças ao excelente roteiro e o cuidadoso posicionamento da câmera, sempre ajudando a contar a história. Essa primeira parte é uma prévia do que veremos no filme inteiro. Temos um roteiro afiado, uma das marcas de Tarantino, que prende a atenção tanto nas cenas de ação, como nos longos e criativos diálogos. O equilíbrio é constante entre cenas dramáticas e cômicas. Por isso, a obra, com duas horas e meia de duração, passa longe de ser enfadonha.

A outra característica da introdução que é mantida por todo o filme é o cuidado artesanal a cada cena, o que existia em uma escala menor nos outros filmes de Tarantino. Cada quadro de Bastardos Inglórios é esteticamente perfeito: o enquadramento, a direção de arte e a fotografia estão espetaculares como nunca foram antes na sua filmagrafia. É um avanço que eleva a genialidade do cineasta, que pode ser considerado, agora, um Mestre do Cinema.

Digo isso não só pela estética do filme, e sim por Bastardos Inglórios atingir um patamar raramente alcançado: é um filme ao mesmo tempo popular e de arte – ele consegue, ao mesmo tempo, divertir e utilizar perfeitamente (e com criatividade) as ferramentas do cinema. Poucos diretores conseguiram este feito. Cito Alfred Hitchcock, com sua Janela Indiscreta e Akira Kurosawa com Os Sete Samurais.

Ou seja, roteiro, direção, edição, fotografia, direção de arte, figurino (esses dois últimos sendo bem fiéis à época retratada, dando um ar de realismo à trama totalmente fora da realidade de Tarantino) e atuação (todos estão bem no filme, dos protagonistas aos que fazem apenas pontas, como Mike Myers), tudo se encaixa em Bastardos Inglórios, um filme essencial pra quem gosta de cinema.

Infelizmente, o filme deve ganhar poucos Oscars (aposto em Roteiro Original e Ator Coadjuvante para Watz, e só) pois a briga para Melhor Filme está mesmo entre Avatar e Guerra ao Terror. Pela sua qualidade, Bastardos deveria estar no páreo também. Mas quem sabe não temos uma surpresa? É esperar dia 7 pra ver.

FICHA TÉCNICA

Título original:  Inglourious Basterds
Ano de lançamento: 2009
Direção: Quentin Tarantino
Produção: Lawrence Bender
Roteiro: Quentin Tarantino
Elenco: Brad Pitt (Aldo Raine), Christoph Waltz (Hans Landa), Mélanie Laurent (Shoshanna), Diane Krueger (Bridget Von Hammersmack), Eli Roth (Donny Donowitz), Daniel Bruhl (Fredrick Zoller).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Original, Melhor Ator Coadjuvante (Christoph Waltz), Melhor Edição, Melhor Fotografia, Melhor Mixagem de Som, Melhor Edição de Som.
Nota: 9.5
Próximo filme do Especial Oscar: Um Sonho Possível (The Blind Side).

Especial Oscar: Preciosa – Uma História de Esperança (Dir: Lee Daniels)

13/02/2010

Preciosa emociona. De verdade. Os detratores deste filme podem falar o que quiserem: a trama é previsível, já vimos essa mesma história milhões de vezes no cinema, etc. Argumentos que tem seu fundo de verdade, mas que pouco significam frente à mensagem que o filme passa e a emoção genuína transmitida pelas atrizes principais, Gabourey Sidibe e Mo’nique.

Créditos: Reel Movie Thoughts

Apesar de seu nome, Claireece “Precious” Jones (Sidibe) está longe de sentir preciosa. Praticamente analfabeta, pobre, obesa e grávida pela segunda vez de seu próprio pai, a garota não vê um grande futuro à sua frente. Para piorar, sua mãe Mary (Mo’nique)  a trata como uma escrava, obrigando-a a fazer todas as tarefas domésticas. Com todos esses fatores somados, a auto-estima de Claireece chega ao fundo do poço. É aí que sua vida da uma guinada ao mudar para uma escola alternativa, na qual vai, lentamente, redescobrir seu valor e trilhar seu caminho para a total liberdade.

Como disse acima, Preciosa – Uma História de Esperança esbarra em algumas barreiras praticamente inevitáves: não é um enredo inovador, nem surpreendente. A história do “azarão” que deve superar obstáculos para vencer na vida já foi contada inúmeras vezes. Ainda há um grave problema técnico: a câmera do filme ora é trêmula e fazendo movimentos amadores, ora é estática e com movimentação calculada. Tal deslize perturba a identidade da produção, além de ser feio esteticamente. Mas mesmo assim o filme funciona.

Funciona porque Lee Daniels trabalha muito bem com o material que lhe é dado. Ele conseguiu criar um personagem principal interessantíssimo já nos minutos iniciais, e isso faz toda a diferença. Ao vermos as situações desumanas a que a menina é imposta, imediatamente passamos a torcer por ela, e isso se mantêm até o final.

Outro ponto importante que merece ser destacado é que, por incrível que pareça, Preciosa nunca apela para situações melodramáticas: ao contrário, ao apenas mostrar o cotidiano da menina, Daniels mantém uma certa distância dela. Até porque não é necessário: a história de Claireece já é triste o suficiente sem precisar forçar a barra.

Mas, apesar de todo esse esforço do diretor, a história não funcionaria sem um bom elenco. Felizmente, ele não só dá conta do recado, como nos presenteia com verdadeiros tours-de-force. Gabourey Sidibe interpreta Preciosa com muita sinceridade – a sua indicação ao Oscar é mais do que merecida. E o que falar de Mo’nique? A comediante se mostrou a maior surpresa do ano, criando uma mãe que causa nojo e em certos momentos, verdadeira pena. Ela simplesmente rouba a cena – não tem como não prestar a atenção em Mo’nique. O Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante já é dela.

Preciosa é realmente uma história de esperança: não importa qual seja a sua situação, é sempre possível vencê-la. Filmes assim sempre tem muito apelo popular e dão muito certo no cinema, não tem como negar. Mas Preciosa é um filme acima da média dentro do seu nicho, graças a uma direção atenta e atuações que não se vê todo dia. Vale a pena.

FICHA TÉCNICA

Título original:  Precious – Based on The Novel Push by Sapphire
Ano de lançamento: 2009
Direção: Lee Daniels
Produção: Lee Daniels, Gary Magness, Sarah Siegel-Magness.
Roteiro: Geoffrey Fletcher
Elenco: Gabourey Sidibe (Precious), Mo’nique (Mary), Paula Patton (Ms. Rain), Mariah Carey (Ms. Weiss).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Atriz (Gabourey Sidibe), Melhor Atriz Coadjuvante (Mo’nique), Melhor Edição.
Nota: 7.0
Próximo filme do Especial Oscar: Bastardos Inglórios (Inglorious Basterds).

 


Especial Oscar: Up – Altas Aventuras (Dir: Pete Docter e Bob Peterson)

10/02/2010

Observação: Este texto foi publicado originalmente no Jornal da Cidade de Bauru e no site do qual participo, Idoso Mídia (www.faac.unesp.br/pesquisa/idosomidia) em 2009, com o título de “Ao Infinito…e além!”.

Créditos: Insidesocal

Em matéria de longa-metragem de animação atualmente, a Pixar reina soberana. Desde Toy Story, em 1995, ela vem acumulando sucesso atrás de sucesso com seus filmes, todos feitos com computação gráfica. A Disney, percebendo o grande negócio, tratou logo de comprar a “empresa-toque-de-midas”. Com Up – Altas Aventuras (Up, Estados Unidos, 2009, direção de Pete Docter), o resultado não poderia ser diferente. O filme, que estreou nos cinemas de todo o Brasil em 4 de setembro, já é sucesso de crítica e público. Segundo o IMDB, site com a maior base de dados de cinema do mundo, o filme já o 73º filme com maior bilheteria no mundo, e tem 97% de aprovação no site Rotten Tomatoes. A pergunta que pode estar na cabeça do leitor é: o filme é tão bom assim? É. Mas isso não quer dizer que ele seja perfeito.

A Pixar ainda esbanja criatividade ao criar uma trama não convencional com personagens idem. Afinal, você não esperaria ver como protagonista de um desenho um velhinho de 78 anos, ou um vilão que seja mais idoso ainda, certo? Pois esses são dois dos personagens mais importantes de Up. Carl Fredricksen (dublado por Edward Asner na versão original e por Chico Anysio na dublada) é um viúvo ranzinza que está prestes a perder sua casa e ir para um asilo por agredir uma pessoa, quando de repente tem uma idéia. Ele decide amarrar balões a sua casa e “transportá-la” até um paraíso tropical na América do Sul (que tem muita semelhança com a nossa Chapada Diamantina), um sonho antigo seu e de sua finada esposa, Ellie. Já o vilão da vez é Charles Muntz (dublado pelo veterano do cinema Christopher Plummer na versão original), um aviador que vive no tal paraíso, em busca de uma ave rara para provar ao mundo que ela existe. Muitos anos antes, cientistas concluíram que as provas trazidas por Muntz desse animal eram fraudulentas, o que causou o declínio de sua carreira. No meio dessa história, ainda temos espaço para o engraçadinho escoteiro Russell, que viaja junto com Carl por acidente, e é odiado pelo ancião.

A construção dos personagens é o maior trunfo do filme. Seguindo a linha de outros filmes da Pixar, os personagens não são perfeitos nem monocromáticos. Ao contrário, cada um deles não aparenta ser o que realmente é: Karl não é apenas um velho amargo, apenas alguém que sofreu e ainda sofre com a perda da esposa; Russel não é um menininho tão feliz quanto se imaginava e Muntz não é o típico vilão desumano, embora precisasse de mais desenvolvimento. Eles conseguem sustentar o filme inteiro, nos deixando com os olhos grudados na tela para saber o que vão fazer em seguida, além de torcermos por ou contra eles a todo momento.

Os aspectos técnicos do filme também são um ponto positivo: as cores estão mais vivas e variadas do que nunca, e a animação, cada vez mais realista. Concordo com o crítico Roger Ebert, que classificou Up como “um espetáculo visual”.

A trama é magnífica, principalmente a sequência inicial, quase sem diálogo, que mostra o passar dos anos para Ellie e Carl, e como não conseguiram realizar o sonho de viajar. Também é a parte mais emotiva do filme, mas que não descamba para o trágico ou melodramático. No entanto, percebemos que a história é repleta de clichês na segunda parte do filme, o que é raridade nas produções da Pixar. A redenção do protagonista ao ler uma mensagem escrita pela esposa, as cenas da batalha entre Carl e Muntz e principalmente o desfecho são apenas alguns exemplos. No entanto, não é nada que comprometa o longa, que consegue fazer rir, vibrar e emocionar o público na medida certa.

Mas esses pequenos defeitos na trama nos deixam receosos quanto ao futuro da Pixar: seria o começo do fim? Com 3 sequências de filmes anteriores confirmadas (Toy Story 3, Carros 2 e Os Incríveis 2), estaria a tão louvada criatividade do estúdio acabando? Esperemos que não. Teríamos muito a perder.

Para terminar, é preciso notar que os efeitos 3D do filme são bem discretos, suaves e apenas dão alguma noção de profundidade: não espere muitos objetos voando em sua direção ou algo parecido. Quem for assistir a versão em 2D não estará perdendo muito no aspecto visual.

FICHA TÉCNICA

Título original:  Up
Ano de lançamento: 2009
Direção: Pete Docter e Bob Peterson
Produção: Jonas Rivera
Roteiro: Bob Peterson e Pete Docter
Elenco (vozes): Versão original – Edward Asner (Carl Fredricksen) e Christopher Plummer (Charles Muntz) / Versão brasileira – Chico Anysio (Carl Fredricksen).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Filme de Animação, Melhor Roteiro Original, Melhor Trilha Sonora, Melhor Edição de Som.
Nota: 7.0

Especial Oscar: Guerra ao Terror (Dir: Kathryn Bigelow)

10/02/2010

 

Créditos: Cinema com Rapadura

Guerra ao Terror está ganhando forças para disputar os principais Oscars. Já faturou prêmios de Melhor Filme importantíssimos, como o do Producers Guild Awards (os mesmos que votam para os Oscars), da Broadcast Film Critics Association e da National Society of Film Critics. Com Avatar ganhando os prêmios de Melhor Filme e Melhor Diretor no Globo de Ouro, a briga promete ser boa.

No entanto, por incrível que pareça, eu não me junto ao hype que críticos do mundo todo vem construindo à esse filme. Não me levem a mal, Guerra ao Terror é bom, mas poderia ter sido muito mais que foi.

A Guerra do Iraque pode ser recente, mas Hollywood já se aproveitou do tema em produções recentes, como No Vale das Sombras e Stop-Loss. Mas o filme de Kathryn Bigelow parece ser o que melhor transmite a sensação de estar na guerra. Com um olhar pessoal e próximo aos personagens, ela nos conta a história de um esquadrão anti-bombas prestes a terminar sua missão e retornar para casa. Depois da morte do líder do grupo, o irreverente sargento William James (Jeremy Renner, indicado ao Oscar por uma atuação mediana) é chamado para substituí-lo. Apaixonado pelo que faz, mas com pouquíssimo respeito às regras, ele passa a gerar desconfiança em alguns de seus colegas.

Se tem uma coisa que o filme acerta em cheio, é o clima. A tensão permeia cada plano do filme, seja quando os personagens estão relaxando (a cena em que eles “brincam” de luta é um exemplo – seria brincadeira mesmo ou estão extravasando as tensões geradas pelos atritos nas missões?), seja quando estão desarmando perigosas bombas, que podem explodir a qualquer momento. Desse modo, a diretora consegue mostrar como vidas podem ser ceifadas tão repentinamente. A fotografia realista e a câmera ligeiramente trêmula contribuem para aumentar este efeito.

O grande problema que percebi no filme é a falta de um estudo maior sobre seus personagens. Afinal, por mais tensas e bem montadas que sejam as cenas de desarmamento de bombas ou qualquer outra de ação (são a melhor parte do filme), não chegamos a conhecer os protagonistas de verdade, e seus conflitos só são desenvolvidos superficialmente. Por exemplo, em uma cena, Sanborn (Anthony Mackie) diz que não quer casar com sua namorada, que está nos Estados Unidos, e em outra, depois de passar por maus bocados em uma missão, diz que quer firmar o compromisso com ela. E só! Porque o roteiro de Mark Boal não explorou mais essa sensação de mortalidade imediata de Sanborn, que queria ter filhos com sua garota para não passar por essa vida “em branco”. O mesmo pode se dizer do sargento James: ele é viciado em seu trabalho, mas fica nisso: ele é viciado em seu trabalho. O roteiro não explora as conseqüências ou causas disso. Para um visão tão personalista da guerra, esse tipo de abordagem ficou faltando. Tensos filmes de ação existem aos montes por aí, mas seria uma novidade ver um filme desses dando igual espaço para mostrar como os personagens lidam com o que acontece  filme desses dando igual espaço para mostrar como os personagens lidam com o que acontece  à sua volta. Ficou faltando um pouco disso para Guerra ao Terror ter sido uma obra revolucionário. Afinal, quando nós nos importamos com os personagens, a mensagem passada pelo filme é muito mais eficaz, não é?

Apesar desse problema, Guerra ao Terror consegue mostrar como é viver em clima de guerra e o quanto isso pode ser aterrorizante. Apesar de superestimado por todos, é um filme sólido graças à direção firme de Kathryn Bigelow. Mas não será nada justo se a produção vencer a estatueta principal do Oscar – uma de Melhor Diretor para Bigelow, por outro lado, não seria de todo injusta (e seria uma vitória histórica – a primeira mulher a vencer o prêmio de Direção).

PS: Por incrível que pareça, Guerra ao Terror há muito tempo já está disponível nas locadoras do Brasil. Agora as distribuidoras firam o erro que cometeram, e o filme ganhou um lançamento nos cinemas. Meio tarde, não?

FICHA TÉCNICA

Título original:  The Hurt Locker
Ano de lançamento: 2008
Direção: Kathryn Bigelow
Produção: Kathryn Bigelow, Mark Boal, Nicholas Chartier, Greg Shapiro.
Roteiro: Mark Boal
Elenco: Jeremy Renner (William James), Anthony Mackie (Sanborn), Brian Geraghty (Eldridge).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Original, Melhor Ator (Jeremy Renner), Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Trilha Sonora, Melhor Som, Melhor Edição de Som.

 

Nota: 6.5

Próximo filme do Especial Oscar: Preciosa – Uma História de Esperança (Precious: Base don the Novel Push by Sapphire).

 


Especial Oscar: Distrito 9 (Dir: Neill Blomkamp)

06/02/2010

 

Créditos: Trashfilmguru

Dentre as indicações-surpresa do Oscar 2010, a de Distrito 9 para a categoria de Melhor Filme foi uma das maiores. Não pelo fato do filme ser ruim (aliás, está longe de ser um), mas sim por ser um filme predominantemente de ação, com vários momentos cômicos (dois gêneros que não costumam figurar nas categorias mais importantes). Verdade seja dita: se não fosse a decisão (equivocada) da Academia de aumentar o número de indicados para o seu prêmio máximo de 5 para 10, Distrito 9 não teria sido indicado. Dizem que ela só fez isso para chamar a atenção do público mais jovem, que não costuma dar bola para a premiação, enquanto a justificativa oficial foi “valorizar os bons filmes feitos todo ano”. Pra mim, a decisão não foi feliz pelo fato de incluir vários filmes que não tem chance nenhuma de ganhar; é, portanto, uma indicação enganadora, traiçoeira. Produções de muita qualidade como Up – Altas Aventuras e este Distrito 9 não tem a mínima chance.

Mas vamos falar do filme em si.  Distrito 9 foi produzido por Peter “Senhor dos Anéis” Jackson e dirigido pelo novato Neill Blomkamp, que também assinou o roteiro junto com Terri Tatchell. Blomkamp, por sua vez, baseou-se num curta que filmou em 2005, chamado Alive em Joburg. As duas histórias têm basicamente o mesmo enredo: alienígenas buscam refúgio em Johanesburgo, África do Sul após algum tipo de conflito em seu planeta natal. Os humanos, mostrando o quanto são acolhedores e caridosos, despejam os ETs em um abrigo temporário que logo se torna definitivo e um gueto com o tempo – o Distrito 9 do título. Após décadas de convivência, humanos e “camarões” (apelido dos alienígenas – dado pelos humanos, obviamente) se odeiam e quaisquer ações sobre o assunto ficam dificultadas. É aqui que entra o protagonista da história, Wikus van Der Merwe (tente pronunciar isso!), interpretado por Sharlto Copley. Responsável por transferir os aliens para um local mais afastado, ele acidentalmente entra em contato com uma substância que o faz se tornar, pouco a pouco, um “camarão”! A partir daí, ele tem que escapar de uma organização a qual ele próprio fazia parte, que pretende usá-lo para manipular armas dos alienígenas (humanos não conseguem usá-las), além de procurar uma cura antes que ele se torne um extraterrestre para sempre.

Distrito 9 é um sopro de ar fresco nas produções do gênero, com um dos roteiros mais bizarros e ainda assim pra lá de criativos dos últimos tempos. Desse motivo devem ter resultado as indicações à Melhor Filme e Melhor Roteiro. A história é contada de modo documental, com câmeras trêmulas nas seqüências de ação e depoimentos dos personagens ao longo do filme. O recurso, apesar de batido, consegue imprimir um tom realista à história, o que faz o público realmente prestar atenção ao que está acontecendo. O filme também se aproveita do carisma quase automático de Van Der Merwe, um trapalhão clássico, para fisgar a platéia. Vale aqui minhas palmas para Copley, que se mostra totalmente à vontade no seu personagem, mesmo este sendo seu primeiro papel em um longa-metragem. Outro acerto certeiro da produção é sutilmente inserir críticas sociais, a principal delas sendo a discriminação. Não é por coincidência que o local escolhido para o desenvolvimento da trama foi a África do Sul, local onde ocorreu o apartheid, que teve como símbolo de resistência o ex-presidente Nelson Mandela. Blomkamp aqui mostra com carga total a insensibilidade dos humanos, brancos ou negros, que tratam os alienígenas como se eles fossem contagiosos. Para o diretor e roteirista, todos os humanos são os vilões – nós torcemos mesmo, durante toda a projeção, para os alienígenas.

A parte técnica da obra é um capítulo à parte. Blomkamp, que já trabalhou em vários filmes como técnico de efeitos visuais, foi minucioso com esse aspecto de seu filme. Os ETs são incrivelmente bem feitos e naturais, tanto que nem parecem que foram adicionados digitalmente. A direção de arte se esforçou para ser pioneira e criar objetos e seres que não se parecessem com nada visto antes no cinema. E conseguiram. Os aliens contém tantos detalhes que é impossível perceber todos graças ao rápido ritmo da narrativa; as armas e a nave são extraordinárias e belas. As cenas de ação – todas de tirar o fôlego – são muito bem editadas (dá pra ver o que está acontecendo! Aprenda, Michael Bay!), com cada quadro oferecendo algo interessante ao público. A fotografia é sensacional ao usar basicamente apenas filtros amarelos, o que dá uma correta sensação de sequidão ao local onde se passa a história.

Se há algum erro no filme, este erro está no desenvolvimento dos personagens e na segunda parte da história. Nenhum personagem, seja ele alienígena ou humano, é bem trabalhado – todos são superficiais, até mesmo o protagonista. Os “vilões” do filme, que caçam Mikus, mal aparecem, o que poderia ter rendido boas cenas mostrando o outro lado da história. E os alienígenas – os mais interessantes de todos – ficam sempre em segundo plano. E se o conflito apresentado aqui é um dos mais criativos dos últimos tempos, ele é praticamente jogado para o alto na sua segunda metade, quando uma sucessão de clichês aparece na tela (caçador torna-se caçado / alia-se a antigos inimigos / torna-se amigo deles…a lista não pára), além de os primeiros furos de roteiro começarem a aparecer, como os dois protagonistas (Mikus e um “amigo” alienígena) invadindo um local de segurança máxima e nada acontecendo com eles.

Distrito 9 é um filme que diverte, e por isso é bom. Mas suas limitações o impedem de ser ótimo – e são elas que tiram qualquer chance dele ganhar o Oscar de Melhor Filme e Melhor Roteiro. Como Efeitos Visuais já é de Avatar, a única real chance de um Oscar para o filme é para Melhor Edição. Mas é uma grata surpresa, e seria bom se os filmes de ação fossem mais como Distrito 9.

 FICHA TÉCNICA

Título original:  District 9
Ano de lançamento: 2009
Direção: Neill Blomkamp
Produção: Peter Jackson e Carolynne Cunningham.
Roteiro: Neill Blomkamp e Terri Tatchell
Elenco: Sharlto Copley (Mikus Van Der Merwe).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado, Melhores Efeitos Visuais, Melhor Edição.
 
Nota: 7.0
 
Próximos filmes do Especial Oscar: post duplo com Up – Altas Aventuras (Up) e Guerra ao Terror (The Hurt Locker).

Especial Oscar: Amor Sem Escalas (Dir: Jason Reitman)

03/02/2010

Créditos: What's new Lili

Antes de mais nada, eu protesto! Quem traduziu o título desse filme? Amor Sem Escalas é um dos títulos mais mal adaptados da atualidade. Tudo porque Up in The Air (o título original, que significa, mais ou menos, lá em cima, no ar) é um drama, com algumas cenas bastante pesadas, e a tradução tupiniquim dá a impressão que o filme é uma comédia romântica, e das mais banais. Outro engano: a obra é uma das melhores de 2009, podendo muito bem levar o Oscar de Melhor Filme (e o de Melhor Roteiro Adaptado é praticamente garantido – é baseado no romance do Walter Kim).

A impressão que tive ao término da projeção é que era um filme que há algum tempo precisava ser feito. O motivo é que os dois temas interligados tratados pelo filme são de suma importância para todo o mundo atual: os efeitos da recessão econômica pela qual estamos passando e a contínua despersonalização de relacionamentos, sejam amorosos ou familiares. Amor Sem Escalas, do diretor Jason Reitman (do ótimo Juno e Obrigado por Fumar) consegue adequá-los perfeitamente à narrativa, de modo que a crítica contida na narrativa se torne muito clara, daí a força do longa-metragem.

George Clooney, no melhor papel de sua carreira (aquele Oscar que ele ganhou por Syriana foi roubado), vive Ryan Bingham, um homem que detesta ficar em casa e manter contato com sua família. A maior parte do tempo ele passa voando para todos os cantos dos Estados Unidos, fazendo seu trabalho – demitir pessoas quando os chefes destas não o querem. A satisfação sentida por Ryan é logo abalada com a chegada de uma estagiária, Natalie (Anna Kendrick). Após o dono da empresa (Jason Bateman) acatar a sugestão de Natalie de demitir as pessoas por computador, ele designa Ryan para mostrar a Natalia como o trabalho é feito.

Com uma premissa simples, o filme fica cada vez mais complexo. De situações cômicas, passamos a encarar os duros depoimentos de funcionários que foram demitidos por Ryan. As cenas funcionam muitíssimo bem porque, na maioria das vezes, não há atuação: são pessoas que foram demitidas de verdade. A produção pediu a elas que dissessem o que queriam ter dito quando ficaram desempregadas. Com isso, o filme também possui o trunfo de dar faces, histórias às pessoas diretamente atingidas pela crise – o que os jornais transformaram em números e estatísticas.

Se parasse aqui, Amor Sem Escalas já seria genial. Mas tem mais! Na segunda metade da produção, Reitman opta por focar mais nos relacionamentos de Ryan. E aqui o roteiro possui papel fundamental. Ele transforma uma situação vista mil e uma vezes antes no cinema (pessoa que não quer relacionamento sério é conquistada / se apaixona por outra) em uma sucessão de acontecimentos dinâmicos e diálogos criativos, como a cena em que Ryan e seu affair (totalmente sem compromisso) Alex (Vera Farmiga) conversam com Natalie sobre como o amor mudou para os dois primeiros com o passar dos anos. Os diálogos entre Alex e Ryan também estão entre os pontos altos do longa.

Vale destacar outras cenas que contribuem para mostrar a falta de intimidade entre as pessoas no mundo de hoje, como as ocasionais palestras ministradas por Ryan (“Família, amigos e amores fazem sua mochila ficar mais pesada. Não dá para levá-los com você. Jogue-os fora”) e a estranheza que ele causa a seus familiares – para eles, Bingham é nada mais que um estranho.

E o que falar do sonho do protagonista – conseguir acumular 10 milhões de milhas percorridas de avião? É um sonho vazio – ele o quer apenas para esbanjá-lo, e não porque é algo que ele deseja do fundo de sua alma (que poético), o que demonstra a vida vazia que ele leva.

É claro que ele vai mudando de atitude com o passar do tempo, mas é uma mudança lenta, gradual e segura, como diria o general Geisel. Nós acreditamos nela – e isso é muito importante. Tudo culmina para uma belíssima cena final, cheia de ambiguidade. Uma das melhores do cinema de 2009, se não a melhor.

Amor Sem Escalas supera todas as expectativas e vai além – direção firme, roteiro genial e atuações impecáveis (Anna Kendrick e Vera Farmiga, ambas indicadas ao Oscar, vão além de seus papéis e atingem diretamente o espectador – estão ótimas) vão, com certeza, deixar a briga pelos Oscar mais dura.

FICHA TÉCNICA

Título original:  Up in The Air
Ano de lançamento: 2009
Direção: Jason Reitman
Produção: Jeffrey Clifford, Daniel Dubieki, Ivan Reitman, Jason Reitman.
Roteiro: Jason Reitman e Sheldon Turner
Elenco: George Clooney (Ryan Bingham), Vera Farmiga (Alex Goran), Anna Kendrick (Natalie Keener), Jason Bateman (Craig Gregory).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Ator (George Clooney), Melhor Atriz Coadjuvante (Anna Kendrick e Vera Farmiga).
NOTA: 9.0
Próximo filme do Especial Oscar: Distrito 9 (District 9).

Especial Oscar: Avatar (Dir: James Cameron)

01/02/2010

Crédito: Northshore Movies

Como todos sabem, o festival de premiação mais popular do cinema, o Oscar, está chegando. Em 7 de março, os vencedores serão finalmente conhecidos. Amanhã, dia 2, saberemos quem foram as produções indicadas. Vamos nos adiantar um pouco, e analisar um dos filmes que com certeza receberá indicações, como a de Melhor Filme: Avatar. Nos próximos dias, farei críticas sobre alguns dos indicados. Lógico que não será possível cobrir todos, mas tentarei pelo menos criticar todos os títulos indicados a Melhor Filme, para que você assista à premiação com mais embasamento. Dito isso, vamos lá!

Avatar, de James Cameron, já é o filme de maior bilheteria da história do cinema. Passou o antigo campeão, Titanic, do próprio Cameron. Também é o primeiro a alcançar a marca de 2 BILHÕES de dólares arrecadados.  Os números não mentem: Avatar é a produção do momento, e é um dos favoritos para ganhar o Oscar de Melhor Filme. E, ao ver o filme na sua versão em 3D, é possível afirmar: ele realmente tem ótimas chances de ganhar o prémio máximo da Academia.

Ambientado num cenário futurístico, Avatar conta a história de Jake Sully (Sam Worthington, de Exterminador do Futuro: A Salvação), um fuzileiro paraplégico que é enviado ao exótico planeta Pandora, para dar continuidade ao projeto Avatar, quando seu irmão gêmeo é assassinado. Através do experimento, a mente de Jake é transmitida para o corpo de um dos habitantes humanóides do lugar, um Na’vi. Jake, que agora pode andar com o avatar (daí o nome do filme), deve estabelecer contato com uma certa tribo e obter informações para seus superiores. Mas quando as duas raças se desentendem e a guerra é iminente, Jake se vê dividido entre os dois mundos.

Pela sinopse é fácil dizer que Avatar parece ser uma história daquelas recheados de clichês. E até tem. Algumas situações são previsíveis, como a paixão que Jake irá sentir pela bela guerreira Na’vi Neytiri (Zoe Saldana) e todo o processo de adaptação do fuzileiro aos Na’vi. Mas esses pequenos problemas não atrapalham nem um pouco o andamento do filme, que tem muito mais acertos do que erros.

O maior deles é o aspecto visual: Avatar é um filme-espetáculo como nenhum outro. Cada cena é composta minuciosamente para espantar, deixar o público de queixo caído. Poucas vezes no cinema as cores foram tão bem utilizadas: às vezes fortes e vivas, às vezes fluorescentes, elas contribuem em grande parte para que as cenas pareçam as mais belas possíveis. E não para por aí: a flora e fauna de Pandora figuram entre as mais inventivas e inovadoras dos filmes de ficção científica. Na primeira metade do filme, praticamente a cada nova cena ganhamos mais informação sobre esse mundo, sendo surpreendidos por uma planta ou um animal extravagante a cada minuto. A técnica responsável por capturar as expressões dos atores que interpretam os Na’vi também é pioneira: pela primeira vez, conseguimos ver suas expressões verdadeiras através dos personagens totalmente digitais, o que os torna muito mais críveis. O destaque aqui vai para Zoe Saldana, que consegue dar ao seu personagem uma sensibilidade ímpar. Poucos filmes tem tamanha capacidade de surpreender. E esse resultado não poderia ter sido alcançado sem a técnica em 3 dimensões, que além de alcançar um efeito de profundidade maior que qualquer outro filme 3D, realmente dá a impressão de que estamos vivendo no mesmo planeta que Jake e os Na’vi. Visualmente, Avatar é praticamente perfeito e inesquecível, e isso supera qualquer clichê.

Cameron, que também assinou o roteiro, conhece muito bem como agradar sua audiência. Ele é um mestre do cinema comercial, acumulando sucessos como O Exterminador do Futuro 1 e 2, Aliens – O Resgate, True Lies e, claro, Titanic, o melodrama por excelência. Aqui, ele junta vários elementos que já deram certo em suas obras anteriores para compor uma narrativa que prende o espectador. Primeiro, ele dosa muito bem o teor de suas cenas: há um equilíbrio entre cenas de ação, de desenvolvimento da história e as cenas puramente visuais, que servem para conhecermos o planeta onde ocorre o filme. Depois, acrescenta mensagem ambientais e anti-bélicas muito relevantes para os dias atuais, além de estrategicamente posicionadas (elas não tomam conta do filme, ainda bem). Assim, Cameron sutilmente nos manipula para que nos apeguemos à Pandora e aos Na’Vi, assim como torcemos para que Jake se dê bem no final. Infelizmente, Cameron se esforça apenas para que nos identifiquemos com os personagens, e para por aí. Ele poderia ter desenvolvido melhor seus personagens, dando uma maior profundidade a eles, algo que também aconteceu com Titanic. A unilateridade dos “mocinhos” e “vilões” é um problema que poderia ter sido facilmente resolvido, já que o filme tem quase 3 horas de duração. É uma pena, porque se o roteiro tivesse sido mais trabalhado, o filme chegaria perto da perfeição. Mas, como disse acima, isso não chega a atrapalhar a experiência cinematográfica.

Avatar é uma experiência visual única, que faz uso máximo da tecnologia disponível. A propaganda feita pelo estúdio Fox de que esse era um filme revolucionário é verdadeira. Resta saber o que o futuro nos aguarda.

FICHA TÉCNICA

Título original:  Avatar
Ano de lançamento: 2009
Direção: James Cameron
Produção: James Cameron, Jon Landau
Roteiro: James Cameron
Elenco: Sam Worthington (Jake Sully), Zoe Saldana (Neytiri), Sigourney Weaver (Dra. Grace Augustine), Stephen Lang (Miles Quaritch), Joel Moore (Norm Spellman).
Indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhores Efeitos Visuais, Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Trilha Sonora, Melhor Edição de Som, Melhor Mixagem de Som.
 
NOTA: 8.0
Próximo filme do Especial Oscar: Amor Sem Escalas (Up in The Air).